Humano Versus Idiota Humano e idiota
Quando o homem percebeu que, usando um galho caído, alcançava uma fruta no
alto de uma árvore, fez-se humano. E, quando percebeu que, usando o corpo do semelhante,
trazia a fruta, já descascada, da árvore até a sua boca, fez-se idiota. O homem é o único
animal que desenvolveu inteligência suficiente para usar o corpo do seu semelhante como
objeto; e, na contrapartida, para disponibilizar o seu corpo para o uso como coisa. O
humano objetiva a coisa. O idiota coisifica o humano.
O ambiente idiota
O clima mudou, a terra secou, a plantação encolheu e o deserto cresceu, o humano
endureceu e se paralisou na disputa da migalha, no conflito miserável em que o amigo
desconhece o amigo, em que Caim mata Abel e o filho chora e a mãe não ouve. É neste
ambiente de aridez, escassez e sofrimento que o idiota se revelou e se multiplicou. É aí que
a fome, a sede, o cansaço e o medo mobilizam no indivíduo todos os instintos da
sobrevivência para a manifestação mais grosseira e estúpida da existência da matéria viva:
o homem que abre mão da condição humana para continuar vivo. Torturado, o combatente
delata o refúgio dos companheiros. Famintos, no alto da cordilheira fria, os sobreviventes
da queda do avião comem a carne de amigos mortos. Desesperada, a mãe ora pela morte do
filho bandido. Alucinado pela tensão do entrevero, o soldado mata o prisioneiro subjugado
que clamava por piedade. Agoniado, o afogado se agarra ao salva-vida e o leva consigo,
abraçado, para o fundo das águas. Cego pelo pânico, o náufrago empurra o velho para fora
do bote. Com as entranhas secas pelo calor do deserto, o sedento imagina uma fonte de
água cristalina onde só existe areia escaldante.
O ambiente sórdido da escassez separa o homem do humano, colocando no meio do
caminho a alternativa idiota. E foi nela que a nossa espécie entrou a dez mil anos atrás.
"Eu Nasci Há Dez Mil Anos Atrás" (Raul Seixas / Paulo Coelho)
E não tem nada nesse mundo que eu não saiba demais
Eu vi Cristo ser crucificado, O amor nascer e ser assassinado
Eu vi as bruxas pegando fogo, Prá pagarem seus pecados, eu vi
Eu vi Moisés cruzar o Mar Vermelho, Vi Maomé cair na terra de joelhos
Eu vi Pedro negar Cristo por três vezes, Diante do espelho, eu vi
Eu vi as velas se acenderem para o Papa, Vi Babilônia ser riscada no mapa
Vi Conde Drácula sugando sangue novo, E se escondendo atrás da capa, eu vi
Eu vi a arca de Noé cruzar os mares, Vi Salomão cantar seus salmos pelos ares
Vi Zumbi fugir com os negros prá floresta, Pro Quilombo dos Palmares, eu vi
Eu vi o sangue que corria da montanha, Quando Hitler chamou toda Alemanha
Vi o soldado que sonhava com a amada, Numa cama de campanha
Eu li os símbolos sagrados de umbanda, Fui criança prá poder dançar ciranda
Quando todos praguejavam contra o frio, Eu fiz a cama na varanda
Eu tava junto com os macacos na caverna, Eu bebi vinho com as mulheres na taberna
E quando a pedra despencou da ribanceira, Eu também quebrei a perna, eu também
Eu fui testemunha do amor de Rapunzel, Eu vi a estrela de Davi brilhar no céu
E pr'aquele que provar que eu estou mentindo, Eu tiro o meu chapéu
Há mais dez mil anos o homem pré-humano, o idiota, inventou a sociedade, a
divisão da comunidade em classes, a economia e a política. Foi quando os idiotas se
apossaram da comunidade e a socializaram para a produção de máquinas humanas. A
escola foi inventada neste processo. E, o que pouca gente se deu conta, produz um conceito
de homem: o homem é uma simples máquina. No período industrial esta produção atingiu o
seu apogeu. Do ponto de vista social, o corpo humano é apenas isto, uma máquina. Não é
por acaso que os circuitos e dispositivos da máquina e seus movimentos recebem nomes de
órgãos e processos humanos: a memória do computador, a mão do robô, cérebro eletrônico, a maquina está pensando; e vice versa, os órgãos do corpo humano recebem
nomes de mecanismos: o corpo humano é uma máquina maravilhosa; a motricidade da criança, válvulas cardíacas, etc. Na verdade o corpo está abaixo do mecanismo, pois é uma
máquina imperfeita, limitada, que reivindica, faz greve, se machuca, cansa, erra, se distrai,
Olha eu de novo
Derrotado, mas não morto, o humano tem lutado contra o idiota nestes dez mil
anos. E, travando o bom combate, criou o prolongamento mecânico do corpo que planta e
cuida da árvore, colhe a fruta na sua época, descasca-a e a traz até a boca do preguiçoso. A
humanidade, para escapar da tirania mecânica, criou a máquina programável. Para a
ideologia das classes não foi o homem e sim esta máquina imperfeita, a humana, que criou
a máquina programável. Seres humanos sabem que foram eles que criaram a mecânica.
Máquinas humanas, não. Elas acreditam que é o mecanismo que gera o progresso.
O ser humano é superior ao mecânico e vê o mecanismo apenas como um
prolongamento do seu corpo, algo totalmente subalterno que, por mais desenvolvido que
seja, sempre lhe é inferior. As máquinas humanas vêem a criação do homem como algo que
lhe é superior. Incapaz de ver o humano, creditam as suas criações a um mecanismo
superior, senhor de todas as máquinas. E como percebe, com suas cabecinhas mecânicas, a
máquina programável como realmente mais perfeita que elas, reconhecem-se ultrapassadas,
obsoletas. Em sua incapacidade de diferenciar o humano do mecânico, conclui que o
homem está ultrapassado por sua criação. E passa a aceitar, com fatalismo, a sua condição
A máquina humana é a contrapartida do idiota. Ela existe afirmando e legitimando a
idiotice. E o idiota se materializa e se torna real, social, graças ao contra pensamento
mecânico que domina os homens reduzidos à condição de máquina. O fim da idiotice
enquanto sistema de dominação da comunidade, a emancipação do trabalho humano, só
será atingido com a liquidação deste ambiente, desta contra cultura mecânica que é
produzida junto com as máquinas humanas.
O sucateamento do humano
A quem a máquina programável torna sucata: à máquina humana ou ao ser humano?
Certamente o ser, respondem os idiotas, sempre interessados no rebaixamento do humano.
É isto mesmo, confirma a sua base de existência, o maquinário humano sempre disposto a
discorrer sobre a necessidade do alicerce para a construção do palácio. Certamente a máquina, respondem os humanos que tem consciência da sua própria humanidade.
É verdade: a máquina programável superou a máquina humana, tornou-a sucata.
Mas não ao homem, pois este não se reduz a um mecanismo. A máquina humana é apenas
uma pequena parcela, um diminuto fragmento, da totalidade humana. Certamente o seu
aspecto mais restritivo, pobre e empobrecedor, porque é essencialmente repetitivo, sem
criação. O processo social é a determinação do mecanismo sobre o humano. Submetido a
ele, o ser humano só se pode conceber reduzido à condição de máquina. A sociedade, de
posse da máquina programável só pode concluir que o homem (ei, seres humanos, bons
entendedores que sois: entendam máquina humana!) se tornou anacrônico, ultrapassado.
Antes da automação eletrônica, o mecanismo social produzia a máquina humana
diretamente da fábrica para o consumidor, a indústria e seus derivativos, que era o seu
centro articulador. A máquina programável a substituiu e ela se tornou sucata. A sociedade
é um mecanismo produtor de máquinas humanas. É a sua essência. Como estas se tornaram
inúteis, mas precisam continuar sendo produzidas (é a condição de existência da
sociedade), passou a ser um mecanismo produtor de sucatas humanas. O produto já sai,
novinho em folha, direto da linha de produção para o . ferro velho, para o aterro sanitário.
Junto com a sucata passou a produzir um novo conceito de homem que nada tem de novo.
É apenas uma conseqüência do conceito anterior: o homem é uma máquina superada. Está
dado o mote para a produção acadêmica comprometida com o Capital e com todo o
processo social: a inutilidade do homem, o seu corpo é imperfeito, cheio de falhas, é uma
coisa que não serve mais p´ra nada. E aí vem o lixo grotesco das teorias do pós-orgânico, pós-humano: o homem é um conjunto de informações que pode ser colocado num
computador, tornando desnecessário o corpo, o organismo. Não riam com este barulho: o
senhor Marcelo Gleiser clama por uma psicologia que trate da psique das máquinas
O cientista político Francis Fukuyama proclamou recentemente que o
advento da engenharia genética e de medicamentos como Prozac anunciam o
início de uma era "pós-humana da história": não só corpos, mas mentes também
poderão ser moldadas pela nova medicina. Adiciono a explosão do uso da droga
Ritalin, dada para milhões de crianças que supostamente sofrem de distúrbio de
déficit de atenção, ou seja, que têm dificuldades de concentração e tendências
rebeldes. A droga ajuda a controlar os sintomas, efetivamente domesticando as
jovens feras. Bill Joy, co-fundador da companhia de computadores americana
Sun, concorda com Fukuyama, chamando a atenção para o desenvolvimento da
nanotecnologia, a possibilidade de construir máquinas de dimensões
moleculares capazes de serem implantadas no corpo humano. Segundo ele,
"será esse o caminho de destruição da humanidade.”
Será possível construirmos computadores inteligentes, tão ou mais do
que nós? Computadores atuais que parecem ser inteligentes, como o Deep Blue
que derrotou Kasparov, o mestre de xadrez, não são. Eles são apenas rápidos,
tão rápidos que podem testar metodicamente bilhões de jogadas por segundo e
avaliar as suas repercussões. A questão da inteligência artificial permanece em
aberto. Imagine uma máquina capaz de criar obras de arte inovadoras, de fazer
perguntas jamais feitas, de se apaixonar e sofrer como humanos. Uma vez,
assistindo a uma palestra de Marvin Minsky, um dos pioneiros da inteligência
artificial, professor do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT),
perguntei se, no caso dessas máquinas serem construídas no futuro, elas
desenvolveriam também patologias mentais, como depressão ou psicose.
Minsky respondeu que "sem dúvida, precisaremos de toda uma nova psicologia
para lidar com esses problemas". Essa questão dá origem a outra: se, de fato,
essas máquinas vierem a existir, elas poderão ser mais inteligentes do que nós.
Nesse caso, nos tornaríamos obsoletos, ultrapassados evolutivamente.
Estaríamos, ao criar essas máquinas, decretando a nossa extinção? Quem sabe?
Os “pós” humano, orgânico e moderno
Quanto pó! De que tipo é? Deve ser droga nova, mais alucinante que o esctasy.
Vamos deixar a fantasia de lado e analisar estes pós acompanhando os artigos de Marcelo
Gleiser publicados no jornal Folha de São Paulo. Este senhor entende bastante deles pois
abriu mão da sua condição de ser humano em nome da ciência, mais especificamente, da
Ao contar o início de sua carreira de cientista, relembra a resistência
familiar: "Mas quem é que vai te pagar para ficar contando estrelas, filho?",
disse o pai, que o queria engenheiro. (O livro do cientista, de Marcelo Gleiser
E, ainda por cima, é professor de física teórica do Dartmouth College, em Hanover
(EUA), como lembra o jornal ao final de cada um dos seus artigos. O fato de estar no olho
do furacão da idiotice humana o torna um idiota interessante. Com ele veremos que os pós
humano, pós moderno e pós orgânico não passam de pós traficados por gangues
acadêmicas (Comando Vermelho do MIT, PCC de Yale e Havard, com os seus
Fernandinhos Beira-mares, Fukuyamas e quejandos) para entorpecer as máquinas humanas
que perderam a função na produção programável. Os tais pós são derramados por todas as
vias - eletrônicas, jornalísticas, sonoras, internetnianas, bestsellerianas, Gramynianas,
Oscarinianas, Holywoodianas, world musicanas - em todo planeta com um único objetivo:
manter as máquinas humanas aprisionadas ao delírio idiota
O principal antagonismo da nossa era
Alguns ingênuos (e outros nem tanto) acreditam que o antagonismo entre homens e
máquinas é o grande conflito dos nossos dias. Holywood, sempre na vanguarda da idiotice
com os seus filmes de ficção (a ficção é que eles seriam só de entretenimento), alerta para o
perigo da rebelião das máquinas contra os humanos. É para ela que o cientista Gleiser rende
um respeitoso preito: a ciência agradece à arte. As observações em itálico entre parênteses
Oitenta anos de ciência em Hollywood (ciência em Holywood!!, perdoai, senhor, ele não sabe o que diz!) contribuíram para a criação de uma
percepção pública que oscila entre o venerável e o assustador. A ciência cria e
destrói. Novas tecnologias trazem sempre a dupla promessa do bem e do mal.
Os filmes, em sua grande maioria, são representações dessa dualidade. (.) Uma
encarnação recente desse mito nas telas é o filme "Inteligência Artificial", de
Steven Spielberg, no qual a humanidade se torna obsoleta graças à sua própria
criação, robôs inteligentes e emotivos. Outra é a série "O Exterminador do
Futuro", em que máquinas cada vez mais poderosas têm como missão o
extermínio dos humanos (ainda bem que temos Arnold Schwarzenegger para
nos salvar). Inúmeros filmes sobre apocalipses nucleares exploram o mesmo
mito: se nós ousarmos muito com nossas invenções, se roubarmos o segredo
dos deuses, seremos punidos, tornando-nos vítimas de nossa própria criação. A
No entanto, acusar Hollywood de deturpar a ciência apenas para fins
lucrativos, usando a mistura de medo e fascínio que as pessoas têm do novo
para induzi-las a ir ao cinema, é apenas parte da história, a mais óbvia. Existe
também uma relação dual entre o imaginário e o real, que é inspiradora não só
para os que vão ao cinema, mas para os que fazem ciência e vão ao cinema. (.)
Essa relação simbiótica entre arte e ciência é extremamente frutífera. Um dos
meus exemplos favoritos é o romance gótico "Frankenstein". Escrito em 1818
pela inglesa Mary Shelley, o livro inspirou-se na ciência de ponta da época, a
descoberta (feita por Luigi Galvani e explorada por Alessandro Volta, o
inventor da pilha) da "eletricidade animal" e de sua relação com o movimento
muscular e com a vida. O clássico filme homônimo de James Whale, feito em
1931, não só usou toda a maquinaria eletromagnética que existia na época da
filmagem como também a ciência que Mary Shelley jamais imaginaria
possível: Henry Frankenstein (o nome do inventor louco na peça de Peggy
Webling que serviu de base para o roteiro) foi "além do ultravioleta para
descobrir o grande raio que trouxe a vida ao mundo.
E eis que, em 1953, o bioquímico Harold Urey e seu orientador, o vencedor do
Prêmio Nobel de Química Stanley Miller, usaram descargas elétricas para
sintetizar aminoácidos - componentes fundamentais de toda a matéria viva - a
partir de compostos químicos simples como metano e amônia, que eles
acreditavam estar presentes na atmosfera da Terra primitiva. Descargas elétricas
novamente aparecem como o "raio que trouxe a vida ao mundo", dessa vez em
um laboratório real. Pergunto-me se eles viram o filme de Whale e resolveram,
mesmo que inconscientemente, pôr à prova a sua hipótese. (Pergunto-me: quais as produções “científicas” que a “arte” de Holywood inspirou com os personagens Homem aranha, Batman, SuperHomem, Homem Borracha, HulK
Não, os nossos antagonistas não são as máquinas e sim quem as manipula contra os
humanos: os idiotas. Sobre eles o nosso cientista não escreve ou fala uma vírgula sequer,
em todas suas crônicas, livros e palestras. O grande conflito que vivemos hoje nasceu a dez
mil atrás: humanos versus idiotas. E, com a criação da máquina programável, atinge o seu
ponto crítico decisivo: quem será substituído por ela: o ser humano ou a máquina humana?
Quem vai se tornar sucata: o ser humano, o sujeito pessoal e coletivo, com sua cultura? Ou
máquina humana e o seu criador, o idiota?
Falta pouco, muito pouco
Idiotas de todo mundo se unem para demonstrar que é o humano que está sucateado.
Para eles o maquinismo ainda não se esgotou e está prestes a entrar no reduto último do
humano: o processo criador. Logo, logo, dizem os cretinos, vamos ter uma sociedade
informacional, com o mecanismo eletrônico produzindo emoções, criações e sensações. Já,
já os nossos técnicos vão produzir o código do universo, da matéria, da vida, da consciência
e da emoção. Falta muito pouco, simples detalhes, para que as máquinas adquiram
consciência e inconsciência, emoção e, atenção, muita seriedade, psique, alma. Vocês não
perdem por esperar: estamos no limiar da nova era em que o homem se tornará deus,
criador de todas as coisas, da vida (da morte já somos) e da inteligência. O homem que cria
homens como deus o fez com o barro; o homem que cria o universo como deus o fez do
nada, num simples big-bang. Afinal, físico Gleiser, a sua turma não está há menos de um
segundo (0,00001s) do chamado primeiro ato, a explosão primordial, o big bang, que gerou
(A idade do cosmos é) 13,8 bilhões de anos, sua geometria, plana, e a
época em que as primeiras estrelas nasceram, apenas 200 milhões de anos após
o Big Bang, evento que marcou a origem cósmica. (.) O Universo primordial
era extremamente denso, dificultando a passagem da radiação. A situação era
semelhante a uma corrida com tantos obstáculos que fica impossível completá-
la. O cosmo, do Big Bang até 300 mil anos, era opaco. (.) A história do
Universo primordial é como uma peça de teatro dividida em vários atos, cada
qual com seus atores. Indo para trás no tempo, o último ato pertence à física
atômica, com a radiação, elétrons e prótons como atores principais. O ato
termina aos 300 mil anos, quando elétrons e prótons juntam-se para formar
átomos de hidrogênio, e a radiação fica livre, inaugurando a era astronômica
O penúltimo ato pertence à física nuclear, e dura de 0,00001 segundo até 3
minutos após o Bang. No início, prótons e nêutrons não interagem, pois a
temperatura é muito alta. Aos poucos ela vai baixando, e são formados os
primeiros núcleos leves, compostos de grupos de prótons e nêutrons. Esses dois
últimos atos são bem estudados. (.) A teoria prevê que, antes de 0,00001
segundo, a matéria no Universo era composta por uma sopa de quarks e glúons.
Essa foi a sopa primordial cozinhada no RHIC: por breves instantes, a incrível
energia da colisão entre núcleos de átomos de ouro recriou o plasma de quarks e
glúons que existia na infância do Universo com temperaturas de trilhões de
graus. O próximo passo é reconstruir o ato anterior, um passo mais próximo do
E, cientista Gleiser, os seus colegas biólogos não estão prestes a redefinir o
O século 21 promete ser o século da genética, em particular da
engenharia genética. Dos alimentos transgênicos aos clones animais, estamos
presenciando o despertar de uma nova ciência que, como é de praxe com
descobertas revolucionárias, vem acompanhada de muitas promessas e medos.
Ao estendermos a engenharia genética aos humanos, estamos pondo em xeque
não só a sua capacidade de curar (ou prevenir) várias doenças como, também,
de redefinir o que significa ser humano em um contexto no qual seres podem,
Alguém precisa avisar ao senhor Gleiser e aos seus colegas que em laboratório se
fabrica de tudo - Dollys, Franksteins, dráculas, robocops, exterminadores do futuro, do
passado e do presente, Hulks verdes, Super Homens, Homens Invisíveis, Homens
Tartarugas, Homens Aranhas, Homens Borrachas, Homens Morcegos - menos Homens Humanos. O humano é uma exclusividade dos humanos. Mesmo que alguns idiotas
pretendam abrir franchising, jamais conseguirão encapsular a tecnologia de sua produção
simplesmente porque não existe a possibilidade de criação desta tecnologia. Nem antes,
nem agora, nem depois, nem nunca vai ser possível alguém correr ao cartório de patentes e
registrar a sua receita do humano. Como só o humano produz o humano, no momento em
que alguém definir para si como meta a sua produção, instantaneamente se tornará idiota
perdendo assim a condição sine quae non para realizar esta fabricação. Idiotas, senhor
O Deus idiota
Quando o homem se torna deus, deixa de ser humano. Mas, como tornar-se deus é
uma ilusão idiota, resta ao imbecil apenas o fato de não ser mais humano. E aí temos a
ironia dos extremos que se unem: o homem deus não passa de um sub homem. Um homem
que se acredita superior aos outros é sempre escória humana, um subproduto decadente da
humanidade, uma caricatura grotesca, como os nazistas demonstraram autrance.
Primeiro, ao longo de dez mil anos de sociedade, de ruptura da comunidade em
classes, os idiotas rebaixaram o homem à condição de máquina. Depois, no período
capitalista e, principalmente, na fase industrial, produziram o conceito de homem como
uma simples mercadoria, como uma simples força de trabalho. Agora, no período pós-industrial, concluem que o homem é uma máquina inferior à programável. Incapazes de ver
o humano, captam-no apenas na sua redução pobre e parcelada de um mecanismo. E
produzem o conceito de sucata humana que, infelizmente não é apenas uma besteira ou
uma pós-besteira. É mais que isto. Trata-se de uma monstruosidade que articula o
programa da sociedade na sua forma mais extremada de aniquilamento do humano. É o
Capital se perpetuando para além das suas condições de existência. O homem sucata não é
apenas um equívoco oriundo da miopia de tecnocratas que não conseguem diferenciar o
homem da máquina. É o mote para a destruição do humano. O pós moderno, o pós capital,
pretende-se pós humano o que só será possível com o auto aniquilamento da humanidade.
Até agora o homem tem-se feito a si próprio. A teoria do homem sucata demonstra que,
analogamente, o humano pode exterminar a si próprio. Isto não é novidade. Ao longo de
sua história e de sua existência, a humanidade sempre se viu ante a escolha entre a vida e a
barbárie. Os homens deuses, os idiotas, estão na deles. E nós, simples seres humanos
podemos nos tornar educadores e fazermos a nossa.
Em defesa do humano
A principal tarefa da humanidade no período atual é superar esta ameaça sub humana de
aniquilamento da espécie. Propomos, a seguir, alguns princípios que acreditamos
fundamentais enquanto programa de mobilização humana para evitar a catástrofe que se
Um movimento natural produz-se a si próprio em seu movimento interno. Um
criador não gera um outro criador mais poderoso que a si próprio. Mas pode gerar
um destruidor de si próprio. A proposta idiota de encapsular o humano, a psique, a cultura, em mecanismos eletrônicas é delirante. O humano faz-se a si próprio em si próprio, em processo. Não há ponto final neste movimento. É impossível faze-lo fora
Uma totalidade não gera uma totalidade que a contém. Só pode produzir uma que
seja parte de si, um sub total. A totalidade humana só pode produzir, fora de si, uma
parte de si própria, um sub homem. O homem total só pode ser produzido pelo
homem total apenas no homem total. O mecanismo é uma parte reduzida e
simplificada do humano. Jamais constituirá e reproduzirá a sua totalidade.
O psíquico não é material, não é composto de partículas. O repetitivo é material, é
formado de partículas. O humano é subjetivo. O mecanismo é objetivo. A mente ou
psique é o movimento que se inicia com os reflexos, que constituem a sua base
material imediata, e avança até a criação da consciência. Trata-se de um processo
que, tendo uma base material, se realiza sem nenhuma partícula de matéria ou de
força, nem mesmo aquelas que constituem a chamada sopa primordial, o plasma
composto de quarks e gluons do instante zero da criação do universo.
A psique não tem matéria e, portanto, não tem tempo nem espaço. É uma usina
geradora de uma substância especial, também não material, que não é sopa nem pré-sopa, que chamamos vagamente de subjetividade. É com esta substância, sem
matéria, que não ocupa espaço e não tem tempo, que a mente opera ao tratar com a
matéria que se lhe apresenta, sempre, inicialmente, como formas vazias. É com ela
que o sujeito cria o conteúdo das coisas. Conteúdo é, pois, a substância psíquica
pessoal com que os sujeitos preenchem as formas da coisas para torna-las objeto. É
esta substância sem átomos, prótons, elétrons, nêutrons, quarks e gluons que realiza a
transição da psique para a chamada realidade num movimento que Freud chamou de
teste da realidade. É com ela que o sujeito se relaciona com o real. E é só ele, o
sujeito, e ninguém mais, quem vai preencher as formas materiais, em si vazias de
subjetividade e, portanto de conteúdo. A coisa material, formada de átomos, quarks e
gluons, as super cordas, não trazem em si nenhum átomo, quark ou gluon desta
substancia especial, a subjetividade, simplesmente porque ela não os tem. Quem
dispõem dela é, em todo o universo, o humano e é com ela que o sujeito preenche de
conteúdo (ou não) toda a matéria que se apresenta (ou não), atribuindo racionalidade
ao que intrinsecamente não a tem, regularidade ao que, em si, é caótico, significado
ao que existe apenas por existir, sem sentido, intenção ou finalidade prévia. Isto não
significa que a subjetividade independe da matéria. Pelo contrário, esta é sua base,
seu ponto de partida e de chegada, quem lhe determina em última instância. Esta
dependência é facilmente demonstrada pelo fato de, cessado o movimento material
que lhe dá sustentação imediata, a vida orgânica no corpo humano, a usina pára
imediatamente de produzir esta substancia especial, e a subjetividade cessa
totalmente, se apaga para sempre restando dela apenas os seus reflexos materiais,
objetivos. Este acontecimento é tão perturbador e inaceitável quanto inevitável que,
desde o primeiro instante que tomou consciência de sua existência (instante zero,
senhor Gleiser, este sim o verdadeiro big bang) a própria subjetividade, subtraía de
sua onipotência, tratou de inventar uma outra onipotência pretensamente superior,
O Acácio nos explicou que toda informação, inicialmente, é um ruído.
Acompanhemos o movimento do ruído até o conteúdo, que ele nos descreve. Uma
destas antigas piadas de preconceito anti lusitano nos fala de um alemão chamado
Manoel que mandou um telegrama para um amigo que estava no Brasil: Joaquim, sua mãe morreu! “Não é assim que se faz”, explicou-lhe um amigo. “Primeiro você
deve preparar quem vai receber a trágica mensagem falando de algo ameno como
Joaquim, sua mãe tem um gato que subiu no telhado. E aos poucos vai chegando no
drama.” Algum tempo depois Manoel mudou-se para o Brasil e, um belo dia, recebe
um telegrama daquele amigo: Manuel, o gato do seu pai subiu no telhado!.
O amigo do Manuel, em Portugal, tem um conteúdo importante para transmitir para
o seu amigo no Brasil: o gato do pai de Manuel, que é o xodó do filho, subiu ha três dias no telhado e não o que o faça descer. Só Manuel sabe como faze-lo e por isto deve imediatamente orientar como fazer para tirar o gato de lá. Ele vai então até os
correios e redige o telegrama citado.O telegrafo é um equipamento extra-corpóreo,
prolongamento da língua humana. É feito de matéria e mesmo o telegrafo sem fio se
utiliza da matéria - as partículas da ondas - para enviar a mensagem. É a mensagem
que é o conteúdo. O telegrafo transmite não a mensagem, o conteúdo, mas sim os
ruídos que compõem o código Morse: as várias combinações de sons breves e longos
que codificam as letras do alfabeto. Os sons e as letras que elas representam, ainda
não constituem a mensagem. Junto com os postos, os fios, a eletricidade, as ondas
sonoras e eletromagnéticas constituem o meio que conduz a mensagem. Os
radiotelegrafistas, tanto o que codifica e envia a mensagem quanto o que a recebe e
a decodifica, escrevendo-a no papel, também constituem o meio. O papel em que o
amigo de Manuel escreveu a mensagem e as palavras escritas também não
constituem a mensagem, e sim o meio. O carteiro que leva o telegrama até o
destinatário é outro dispositivo do meio. Toca a campanhia (mais um elemento do
meio) e atende a mulher de Manuel que abre e lê o telegrama, preocupada que está
com o seu conteúdo. Ao fazer a leitura não entende nada: Opá, e daí que o gato subiu no telhado? Como não alcançou o conteúdo presumido, guarda o papel para o
marido. Este, quando chega e lê o telegrama começa a chorar desesperado. O
conteúdo com que ele preencheu as palavras vazias do telegrama levam-no ao
O amigo de Manuel preencheu, com a sua substância subjetiva, a forma o gato do pai subiu no telhado. Preocupado em comunicar este fato para o amigo, criou uma
forma escrita acreditando que ela cumpriria esta função. A partir deste momento
acionou um sistema chamado telégrafo que existe enquanto um determinado tipo de
meio físico para conduzir uma mensagem. Os funcionários do telegrafo, mesmo
sendo homens, participam do meio físico enquanto força de trabalho e reduzem-se,
assim, à condição de máquinas humanos pois são obrigados, pela função, a reduzir o
conteúdo à forma, o meio à mensagem. O conteúdo de suas práticas subjetivas,
nestes contextos não ultrapassam à codificação da palavra ao Morse (e vice versa), à
codificação (ou descodificação) do endereço, no caso do carteiro. Ao reduzir o
humano ao objeto, a mensagem ao meio, o conteúdo à forma, abrem mão do trabalho
útil em nome do abstrato, e, portanto, do humano em nome da função.
Desumanizam-se para poderem incorporar a coisa e integrarem-se, enquanto tal, ao
A forma é o conteúdo; o meio é a mensagem - afirmava o idiota da teoria da
comunicação, Macchulan. Trata-se slogans, bordões ou chamadas (a maneira dos
publicitários, os idiotas da profissão mais antiga do mundo) que propagam a contra
idéia de que o humano é o material. Os semióticos (também chamados de caolhos)
defendem que o código, os signos e os símbolos já trazem em si, encapsulados, o
conteúdo, o humano, mensagem. Daí que aprender é entrar em contato com estes
depósitos objetivos de subjetividade. E educar resume-se a promover os contatos dos
Mas Acácio nos explica: o humano, o conteúdo, não está nas letras, nos códigos, no
papel, nos fios, nos postes, no éter, nas ondas, na eletricidade, nos carteiros, nos
radiotelegrafistas. É certo que sem este equipamento todo não aconteceria a
comunicação no contexto em que ela se deu. Ele é condição necessária mas não
suficiente para que a mensagem seja transmitida. Tanto que, apesar de o ruído passar
por todo ele, no final resultou em conteúdos diferentes, que não realizaram a
comunicação, a informação. Produziu-se conteúdos diferentes e os humanos sempre
produzem conteúdos diferentes pois as subjetividades são sempre desiguais.
Mais que diferentes o processo, na nossa história, produziu conteúdos incompatíveis,
antagônicos. O amigo de Manuel produziu um determinado conteúdo para um
acontecimento que presenciou: o gato do pai do gajo subiu no telhado. Criou uma
forma - a sentença escrita no telegrama - acreditando que ele provocaria o mesmo
conteúdo no amigo. Pelo equipamento telégrafo passou só a forma porque nenhum
meio é capaz de transmitir conteúdo. Conteúdo não se transfere pois as
subjetividades são atributos pessoais, intransferíveis. O que é possível é coloca-las
em correspondência, compatibiliza-las numa contradição não antagônica de modo a
que produzam conteúdos próximos, que se combinam e se complementam, e não que
se conflitem. E a comunicação, a informação só acontece quando ao conteúdo de
partida, a subjetividade de quem acionou o sistema, corresponde a produção de
conteúdo compatível, não antagônico, na subjetividade que recebe o sinal no final do
processo. Os conteúdos produzidos dependem não do meio, mas tanto das
subjetividades pessoais envolvidas, quanto da subjetividade coletiva criada entre
elas, a cultura. O meio físico é apenas o instrumento material que possibilita a
realização da comunicação mas que, por si próprio, não a garante.
É por isto que a televisão, com seus filmes maravilhosos cheios de efeitos especiais,
o livro, com gravuras e textos extraordinários, o computador conectado a internet que
possibilita o acesso a um gigantesco depósito de dados científicos, artísticos e
culturais, não bastam para que a educação e a aprendizagem aconteçam. Não basta
encher uma pessoa, seja criança ou adulto, de livros, coloca-la na frente de uma
telinha, seja de uma tv à cabo, seja de um monitor conectado ao mundo da internet,
posto que não existe educação à distância; quem afirma que educa à distância está,
na verdade, se distanciando da educação. Os recursos materiais exuberantes não
garantem o movimento educativo que se dá, apenas e tão somente, quando as
subjetividades pessoais começam a se combinar constituindo uma subjetividade
coletiva, também conhecida como cultura, geradora de conteúdos compatíveis, não
antagônicos. Os humanos se comunicam, se educam, se informam produzindo
cultura, que é o encontro das subjetividades pessoais combinando-se na formação da
subjetividade (ou sujeito) coletivo. A educação só acontece no interior de um
movimento produtor de cultura; e a cultura só é produzida quando centrada na
Um educador por exemplo, de matemática, entra na classe para ensinar logaritmo.
Pode ser que para ele este item do programa tenha um determinado conteúdo. O pior
de tudo é quando, para o professor, o conteúdo é a matéria que vai dar, é a disciplina
que vai ensinar. Quando o conteúdo é a forma, a subjetividade é a matéria, a criação
é a disciplina não há nada a se fazer. Aí o professor atuará para adestrar o aluno no
tema e, muitas vezes, obterá dele, como conteúdo, um sentimento de inutilidade, de
frustração ou de ódio. Mas, no nosso caso, temos mais que um professor, um
educador matemático que atribui significado e conteúdo para este tema, logaritmo.
Apesar disto, para o aluno ele se apresenta como uma forma vazia, trabalho morto,
totalmente desprovido de conteúdo, de significado. Esta é a questão central que se
coloca para o educador: como atuar com as pessoas, como combina-las para que elas
se mobilizem para preencher com os seus conteúdos pessoais, com as suas
subjetividades, aquela forma vazia? Combinar pessoas, movimentos subjetivos
pessoais é criar cultura, sujeito coletivo. O leva a colocarmos a questão da seguinte
forma: como produzir a cultura que mobilize as pessoas para preencherem de
Os idiotas, cretinos da objetividade, pretendem criar o humano idiotizado, a subjetividade objetivada, o sujeito fora do sujeito, a racionalidade fora da
consciência, a consciência fora do organismo, no mecânico, a subjetividade, a
substância sem matéria, com quarks e gluons. O mecânico é o prolongamento não
orgânico do corpo, é o equipamento extra-corpóreo. Os idiotas pretendem inverter
esta relação: que o corpo passe a ser prolongamento da máquina, que o extra-
corpóreo se torne corpóreo e que o corpóreo se torne extra-corpóreo, que o
prolongamento se torne central (orgânico) e que o central (o orgânico) se torne
prolongamento. Mas o equipamento extracórporeo não pode produzir o significado, o
conteúdo, o sentido, a relação mental, elementos que compõem a subjetividade. Isto
porque qualquer prolongamento não orgânico do corpo, apresenta-se inicialmente
sempre como uma forma vazia que só adquire caráter útil quando preenchido de
conteúdo pelo sujeito. Nenhum equipamento objetivo, mesmo o pós-moderno traz
em si conteúdo, significado. O máximo que traz são relações físicas, materiais, feitas
de partículas de matéria e de força, de supercordas, previamente selecionadas e
combinadas por alguém que as conectou a partir de um significado determinado. Mas
este conteúdo está na subjetividade de quem fez a combinação, o sujeito produtor, e
não de quem entra em contato com ela desconhecendo-a, o sujeito consumidor. Este
primeiro contato se dá sempre, inicialmente, através de reflexos, o fenômeno
material orgânico mais próximo da formação da mente e que lhe serve de base. A
partir daí o sujeito potencialmente consumidor ativará (ou não) a sua usina para
produzir a subjetividade que preencherá (ou não) de conteúdo e significado aquele
objeto. Mas esta subjetividade criada pelo sujeito consumidor nunca será a mesma do
sujeito produtor. Primeiro porque se volta para o consumo e não para a produção;
segundo porque o produtor, assim como o consumidor, tem uma subjetividade que
lhe é própria, a sua marca pessoal, que o distingue de todos os outros sujeitos do
universo, os que já existiram, os que existem e os que vão existir.
As relações materiais, sejam físicas, químicas ou biológicas, acontecem através de
impulsos elétricos, de troca de elétrons, de formação de íons, de reações, da
combinação de supercordas. O significado, o conteúdo, o sentido do eu, a
consciência subjetiva do protagonista, não são dados físicos, materiais. São atributos
humanos que não nasceram com o organismo. São processos psíquicos e culturais
que se formam na combinação do sujeito pessoal com o sujeito coletivo.
O sonho divino de criar sujeito fora do sujeito, vida fora da vida, enquanto estímulo
para criar processos técnicos novos pode ser tolerado. Que o físico, que acha que já
chegou a 0,00001 segundo do big-bang, busque o seu momento exato, o do Fiat lux.
Que o biólogo, que acha estar a 0,00001 segundo do momento da criação da vida,
com os seus genomas e clones, procure o instante preciso em que o barro começa a
pulsar. Nestas brincadeirinhas de Deus podem chegar, aqui e a ali, a conclusões
secundárias interessantes à maneira de Arquimedes que criou o cálculo logaritmo ao
pretender contar os grãos de areia que cabiam no universo. Mas daí tornarem este
rebaixamento do humano, da subjetividade, plano de ação para toda a humanidade já
é uma questão que extrapola aos joguinhos de laboratório. Querem interferir na
caminhada humana, impondo os seus objetivos idiotas e anti humanos aos próprios
humanos! Aí é hora dos humanos darem um basta. Idiotas reduzam-se às suas
insignificâncias. Senhores Franksteins, vocês são deuses apenas para a vossa
patotinha de cretinos. Franksteins economistas: vocês querem impor a vossa verdade
de que o mercado é uma objetividade natural maior do que a humanidade. Boa
viajem! Franksteins políticos: vocês querem impor a vossa verdade de que o estado e
as instituições são objetividades naturais acima da humanidade; boa viajem!
Franksteins sociólogos: vocês querem impor a vossa verdade de que as classes são
formas naturais de organização da humanidade; boa viajem! Franksteins
psicológicos: vocês querem impor a vossa verdade de que os comportamentos
funcionais são as formas naturais de relacionamentos dos humanos; boa viajem!
Frankesteins escolares: vocês querem impor a vossa verdade de que o objeto ensina,
informa e forma o sujeito; boa viajem! Vão com Deus, vocês que já são deuses.
O psíquico não é lógico e, portanto, não é passível de redução algorítmica. O
mecanismo é lógico e, portanto, é algorítmico. O humano é cultural; o mecanismo é
tecnológico. O humano é sempre inesperado, processual, faz-se no movimento. O
mecanismo é sempre esperado, fixado, prévio. O humano é a consciência se
formando no interior do inconsciente. O mecanismo é a lógica, o algoritmo, se
A máquina programável é a ultima realização da tecnologia, a transferência completa
do algoritmo para o mecanismo. Os idiotas entendem educação como o contato com
o algoritmo, o que pode ser obtido pela simples relação material e física do homem,
ser inferior, com o mecanismo, ser superior. Para os humanos educação é o
movimento de mobilização do homem para se tornar humano.
Do ponto de vista humano, o homem faz-se a si próprio em processos culturais de
constituição do sujeito coletivo combinado com os sujeitos pessoais. Do ponto de
vista idiota o homem faz-se a si próprio através de algoritmos que podem ser
codificados em programas. O programa novo é o máximo que o idiota pode criar. A
conexão nova, não prevista, artística, que pode ou não corresponder à uma relação
natural é a base do humano. Nenhum mecanismo pode criar o que não está previsto
em sua lógica. Só o humano pode criar o que não é lógico, o que não está previsto.
Receita para fazer o humano
Para facilitar o trabalho dos doutores Franksteins forneceremos, como humilde
contribuição, um rápido roteiro à guisa de receita. Esperamos, com ele, economizar
trabalho idiota, saltando etapas inúteis. Atenção, idiotas de todo o mundo: papel e caneta na
O universo é uma totalidade em movimento onde tudo se relaciona com tudo
compondo infinitas conexões. O universo é complexo e inesgotável. Cria-lo seria uma
tarefa muito complicada mesmo para vocês, Franksteins sérios e dedicados. Como vimos
um bom número de seres da espécie físicos estão empenhados em produzi-lo em
laboratório. Nada contra. Mas, em nossa receita de criar o humano fora do humano,
recomendamos que esta etapa seja pulada. Ainda bem que o universo já está criado, o que
facilita em muito a vida de idiotas que não são muito chegados na física.
Movimentando-se em suas infinitas relações, a materialidade universal gerou um
movimento particular em seu interior: a vida. As infindáveis conexões materiais
combinaram-se, em si, até que, em dado momento, num salto qualitativo, emerge uma nova
totalidade, a vida. Um dos seus elementos mais simples, a célula, traz, em si, o impulso
vital, a chama do querer viver. A totalidade viva é a combinação de infinitas relações
materiais complexas. Homens superiores e que se intitulam biólogos buscam produzi-la em
laboratório. Mas queremos criar o humano numa receita mais simples e por isto vamos
também pular esta etapa. Afinal, a vida já está criada pelo vosso colega Deus (também
conhecido como Jeová, Alá e quejandos) o que facilitou em muito a vossa tarefa. Alguns
Franksteins biólogos e médicos estão descontentes com esta vida e querem criar uma
melhor. Querem abrir uma concorrência leal e colocar no mercado um produto melhor.
Jóia! Outros idiotas, mais diretos, querem ir logo ao centro da questão e sabem que a vida é
condição necessária mas não suficiente para a geração do humano. Com estes últimos
recomendamos que esta etapa seja pulada nos laboratórios.
Passamos pelos movimentos de criação da matéria e da vida. É certo que os
simplificamos bastante. No interior destes há infinitos movimentos de criação que são
impossíveis de serem listados e descritos. Poderíamos até destacar alguns como os
movimentos de formação dos elementos, das substâncias, das formas de energia na
materialidade universal; e de formação do vegetal, do animal e das diversas espécies na
biosfera. O humano começa no universo material como tudo o que existe. Aprofunda-se na
formação da vida mas não é isto que o faz humano. Até aqui ele não se diferencia enquanto
totalidade no interior de outras totalidades primárias (universos material e vivo). Mas o
importante é que, agora, aproximamo-nos do movimento que nos interessa: o da formação
da consciência. É com ela que se cria o humano. Atenção, Franksteins da alma, da psique e
do sujeito, porque aqui começa a receita do que vos interessa.
Alguns estudiosos da alma nos legaram conceitos importantes que precisamos tomar
como pontos de partida para a nossa receita. Apesar deles não serem idiotas, vocês, que são
convictos, sabem que o objetivo e a ciência estão acima destas veleidades corporativas e
devem considerar o que é importante mesmo quando não vem da confraria dos imbecis.
Tudo que é humano é interessante (“humano non alienum puto est” - tudo que é humano não me é estranho). Mas para vocês, idiotas científicos, não basta ser humano para
ser interessante. É preciso que seja humano manipulável, isto é, que possa ser invertido e
adquira utilidade para a prática de opressão e exploração. Um humano interessante (e vocês
sabem disto, pelo tanto que tem usado de seus conceitos) é Pavlov com a sua teoria dos
reflexos. Para nossa receita vamos tomar o conceito de reflexo enquanto relação primária
entre todos os elementos da natureza. Tudo reflete em tudo, o grão de areia na estrela (e
vice versa), a luz lâmpada do quarto na luz da super nova (e vice versa). Baseados nesta
idéia os físicos criaram teoria das super cordas. A menor porção de matéria não são
partículas de coisas e sim a relação entre as coisas - cordinhas formadas por partículas de
Tudo está amarrado a tudo pelas super cordinhas. E a matéria viva também é
composta por reflexos. Um ser vivo é composto por células que refletem com tudo o que
existe no universo material. As células, elementos da matéria viva refletem enquanto
matéria mas apresentam uma novidade em relação à matéria morta. É Antonio Damásio
(outro humano interessante) que chama atenção para esta novidade: a célula quer viver, isto
é, traz em si o impulso vital. As relações das células com o universo se dá, portanto, através
de reflexos vitais. Um ser vivo pode ser concebido (atenção, idiotas, uma redução
esquemática como vocês gostam!) como um conjunto de reflexos. É nesta infinidade de
reflexos que se inicia o movimento de formação do humano apesar de que, a sua simples
existência não é ainda a consciência. Certamente que é complicado produzir em laboratório
uma infinidade de reflexos. Mas os idiotas que querem ir direto ao assunto podem pular
esta parte e, como muitos já tem feito desde que foi inventada a tal civilização, tomar
conjuntos de células vivas já dadas pela natureza que atendam pelo nome de Zé ou Maria
da Silva. Trata-se de uma matéria abundante e de grátis.
Continuemos com a nossa receita idiota para produzir o humano. Recomendamos
que seja pego um ser vivo, o homem, que já tem uma combinação especial de células. Se
formos tomar qualquer outro ser vivo será muito complicado produzir nele o humano. Um
vegetal qualquer, por exemplo, dará um trabalho danado para ser humanizado. É muito
mais fácil tornar o homem um vegetal, como vocês, idiotas, tem feito desde as origens da
sociedade, do que fazer do vegetal um homem. Nos dez mil anos do vosso domínio vocês
criaram processos de transformar o homem em todo tipo de animal e vegetal: nabo,
abobrinha, burro de carga, toupeira, cão de guarda, etc. Sabem até transforma-lo em
natureza morta como bucha de canhão, suporte de apoio, alavancas, ferramentas, máquinas,
etc. Transformar homem em coisa, em máquina, é o que vocês mais sabem fazer, p´ra não
dizer que é a única coisa que sabem fazer. Este é o principal saber fazer, a principal técnica
que desenvolveram nestes dez mil anos de domínio. Mas fazer o movimento inverso,
transformar coisas mortas e outros seres vivos, em homens, vocês ainda não conseguiram.
Certamente porque nunca interessou. Aliás foi quando o trabalho humano por fim gerou a
máquina programável que vocês tiveram a súbita inspiração de que podem produzir o
humano a partir das coisas já que para vocês o mecanismo é a máxima expressão do
Nós vamos tomar o casal Silva (Zé e Maria) como matéria prima para a produção do
humano. Já vocês querem produzi-lo a partir da máquina programável. Como nós não
estamos interessados nisto, vamos aplicando a nossa receita nos seres de carne e osso
enquanto vocês a vão convertendo para seres de aço e plástico. O homem (ou a mulher) é
um conjunto articulado de reflexos vivos enquanto a máquina programável é um conjunto
articulado de reflexos mortos. Alguns consideram a máquina programável um organismo
vivo porque entendem o reflexo como puro impulso elétrico. Há controvérsias. Para supera-
las aceitemos o bit como matéria viva. Os idiotas mais exigentes, não satisfeitos com esta
simplificação, tem uma lição de casa: criar uma máquina programável com células, isto é,
com matéria viva (desde que ela não seja o homem, pois este já é nossa matéria prima).
Esta infindável rede de reflexos corpóreos é recolhida em todo o organismo por um
sistema de células especiais chamado sistema nervoso. Os terminais nervosos, espalhados
por todo o corpo, conduzem estes reflexos da periferia (sistema nervoso periférico) até o
núcleo cerebral (sistema nervoso central) formado por outras células especiais, os
neurônios. Como esta condução se dá por impulsos elétricos é fácil vocês reproduzi-las nos
vossos mecanismos eletrônicos. Para desempenhar a função dos terminais nervosos vocês
dispõem das células foto-elétricas e outro tipos de mecanismos. Em contrapartida ao
cérebro humano vocês dispõem do tal cérebro eletrônico, o disco rígido que apresenta uma
vantagem: enquanto o que trazemos em nossa cabeça tem um número limitado de
neurônios (alguns bilhões, aproximadamente dez, dizem os contadores de células) vocês
podem colocar muito mais no HD: quantas forem necessárias para as funções desejadas.
A sensação
Ao chegar no cérebro, os reflexos provocam impulsos elétricos entre os neurônios
A base de todo esse processo é a célula nervosa - que se chama neurônio. Um
neurônio é composto de um corpo celular e de prolongamentos deste, que
funcionam como fios elétricos que conduzem o impulso nervoso. O ponto-
chave do processo de passagem do impulso nervoso é a sinapse, o microscópico
intervalo entre a ponta de um neurônio e o começo do neurônio seguinte. Como
acontece com pedaços de um fio elétrico, para que o impulso passe (e se
transmita de um neurônio para o outro), é preciso que esse espaço seja
preenchido por substâncias químicas - os neurotransmissores. Os diferentes
tipos de neurotransmissores afetam diversas regiões do cérebro, e precisam ser
fabricados continuamente, pois sem eles as mensagens elétricas não passariam
de um neurônio para outro e a comunicação ficaria interrompida. A mensagem
se perderia no meio do caminho, sem atingir o cérebro ou a parte do corpo que
deveria obedecer à ordem enviada pelo cérebro. Mas os neurotransmissores tem
de ser destruídos depois da passagem do impulso, caso contrário a mensagem
ficaria reverberando por ali, e a sinapse ficaria bloqueada para a transmissão de
novos impulsos. (Aratangy, Lídia Rosenberg - Doces venenos - Editora Olho
Nos neurônios os reflexos, que são relações primárias, passam a ser relacionados
entre. Estas relações de relações (relações secundárias) constituem o que os humanos
chamam de sensações. Em vossa máquina programável vocês já sabem como criar algo
fisicamente parecido com a sinapse: a conexão entre os bits. O problema é como tornar a
sinapse uma sensação. É a relação entre o impulso elétrico orgânico e a sensação que
começa a se constituir o psíquico, a mente. A sinapse é material, a sensação não. Sem
sinapse não há sensação. Mas a sinapse não é sensação, é o seu suporte material. O medo é
um impulso elétrico mas um impulso elétrico não é um medo. Como superar esta
contradição? Como tornar um impulso elétrico numa sensação? Mais que isto, como
diferenciar, no impulso elétrico, as várias sensações (medo, alegria, angústia, satisfação)?
Uma sensação é um impulso elétrico. Esta aí a sua base material. Mas a sensação já é feita
daquela substância sem matéria, sem quark ou gluon. Como produzir na matéria impulso elétrico esta substância não material? Mais ainda como objetivar nela as variações
qualitativas de medo, satisfação, prazer, etc, que só subjetivamente são percebidas?
Cavalheiros, é este processo de correspondência entre o material e o psíquico que os
neurologistas ainda não desvendaram. Esta aí a primeira lição de casa para vocês: como
transformar o impulso elétrico da máquina programável numa sensação da máquina? Como
mecanizar a sensação? O próximo passo da nossa receita só será possível depois de
respondido esta primeira questão fundamental. Mas, para não travar por milênios o nosso
esquema (será que, algum dia, será resolvida esta questão?) vamos considera-la respondida,
pois na nossa matéria prima, o homem, podemos continuar a nossa busca da criação do
O inconsciente
Temos a vantagem do Zé (e da Maria) já trazerem em seus corpos, em si, a solução
da conversão da relação elétrica em sensação. Os seus cérebros elaboram uma infinidade de
sensações, apesar deles não saberem disto. Em cada instante produzem um oceano de
sensações que se ajuntam com o gigantesco oceano já produzido. Este mare nostrum
ilimitado forma o que Freud (mais um humano interessante) chamou de inconsciente. Daí
extraímos a próxima lição de casa para vocês, meus caros idiotas que pretendem fabricar o
humano em série: resolvido o problema da sensação passem a se dedicar, imediatamente,
para resolver o problema da criação do inconsciente. Dica: façam algo análogo ao que
fizeram com os reflexos. O corpo é um conjunto infindável de reflexos. O inconsciente é
um conjunto infindável de sensações. Vocês tiveram de criar um processo material que,
análogo à transformação da sinapse em sensação, transformasse o impulso elétrico interior
da máquina programável, no correlato da sensação, uma espécie de choquinho que tocasse
não vocês mas o corpo mecânico. É difícil? Virem-se, problema de vocês, os deuses. Ao
fazerem isto terão dado um gigantesco passo do tipo um pequeno passo para um homem, um enorme passo para a humanidade (entenda-se, “idiotidade”): terão começado a criar o
A emoção
Mas o inconsciente não é apenas um infindável oceano de sensações. As sensações,
neste nosso esquema reducionista e empobrecedor da vida (como todo bom esquema deve
ser), constituem o correspondente psíquico das supercordas materiais. São supercordinhas
sem partículas, sem matéria, que não ocupam espaço nem se subordinam ao tempo. Geniais
como só vocês são, já devem ter criado estas supercordas sem partículas no interior da
máquina programável. Vamos, pois, em frente que o mais difícil ainda está por vir. Assim
como os reflexos se relacionam gerando as sensações, estas também se conectam gerando
as emoções. A emoção é uma produção do inconsciente. Ao conectar as sensações entre si
ele produz a emoção, a menor partícula não material do sentimento. Desculpem o abuso
com que lanço mão das palavras: partícula não material realmente é uma enorme besteira.
Mas como considero suprema besteira a intenção de vocês de produzirem o humano em
laboratório, fica tudo elas por elas. Não se esqueçam que, do ponto de vista da imaginação
tudo é possível. Já que vocês imaginam produzir o humano em série, apelo para que vossa
fantasia crie uma partícula não material. Difícil, muito mais difícil que imagina-la vai ser
fabrica-la materialmente. Dificil, extremamente difícil, como dizia o cantor do Bradesco!
Mas é exatamente a isto que vocês se propõem: do material extrair o psíquico, do objeto
chegar no sujeito, da corrente elétrica chegar no amor (apesar de, geralmente, chegarem
A percepção
Já criaram a emoção na máquina programável? Muito bem! Próximo passo, criar a
percepção. As infindáveis cordinhas das emoções (e são tantas as emoções!) vão se
relacionando umas com as outras, amarrando-se entre si e desamarrando-se das travas da
materialidade, do chamado real, arrumando o que estava jogado e desarrumando o que já
estava arrumado na natureza. Tecem-se, nesta dinâmica psíquica, cordas maiores chamadas
sentimentos. E os sentimentos vão se costurando, chamando os neurônios para a produção
de sinapses especiais, sobre um mesmo objeto. São as percepções. As percepções
constituem um mar especial que se constitui no interior do oceano do inconsciente. Este
mar especial Freud chamou de pré-consciente.
Criem a percepção mecânica, na máquina programável, e terão criado o pré-conciente mecânico. Novamente um passo pigmeu para o indivíduo se torna o passo de titã
para a “humanidade”. Se este não acontecer restará, infelizmente, somente o passo de
pigmeu. Mas tenham fé e imaginem-se produtor de máquinas dotadas de inconsciente e pré consciente mecânicos. Estais no umbral do humano, a 0,00001s dele. Mais um passo e
O eu
Freud nos explica que as percepções desenvolvidas no pré-consciente podem criar
novos nexos entre si ou não. Se não, elas tendem a retornar para a condição inconsciente.
No caso de criarem novos nexos, novas cordas mais fortes, apesar de não materiais, elas
evoluem para a condição de idéias. Estas são criações pessoais, super cordas grossas e
presentes, que tecem o pano da consciência pessoal. Quando começa a criar idéias, o
movimento de criação da psique começa a entrar no ambiente humano, produzindo-o,
reproduzindo-o e o ampliando e aprofundando. Uma das primeiras idéias que a mente gera
neste ambiente, a idéia fundamental, é a do eu. Com ela surge a consciência, o
reconhecimento e a identificação que o sujeito produz de que é ele, o seu eu, quem está ali,
imaginando, ligando percepções (que são suas) e chegando a conclusões (que também são
suas, e não do outro). Com o eu surge a consciência, a pessoa, o sujeito que elabora planos,
prevê resultados, faz experiências e sintetiza os seus resultados, enfim, o homem que traça
a rota do seu movimento pessoal, o navegador de si próprio, que faz o caminho, o homem
humano. É este eu,quem dá peso às coisas, que atribui significado às sensações e
percepções, quem avalia as emoções, que administra os becos sem saídas da vida,
encontrando sempre as saídas ocultadas. É este eu, a consciência pessoal, que enche as
formas com conteúdo, um conteúdo só seu, pessoal, intransferível. É nele que as
infindáveis sensações geradas dos infinitos reflexos dos infinitos momentos vividos, que se
transformaram em múltiplas emoções, geradoras de variados sentimentos, que articularam
tantas percepções que teceram as múltiplas idéias conscientes, condensam a vida pessoal
num conjunto de critérios, a partir do qual aquele ser humano avalia o que é significativo
ou não, o que é interessante ou não, o que é bom ou não, o que é conteúdo ou não, o que
essencial ou não. Esta imensa riqueza que torna cada ser humano original, único, é
A consciência pessoal
A consciência surge no interior da pré-consciência e é tão grande quanto uma gota
no oceano do inconsciente. Trata-se de um euzinho tão pequeno quanto pretensioso. Do
fundo da sua pequenez a gota preenche com os seus valores, com os seus nexos, com o seu
conteúdo todas as formas que se apresentam que, apesar de plenas de suas relações
materiais em si, apresentam-se para aquele eu, para si, vazias, a espera do significado que o
sujeito vai lhe atribuir. É neste eu que se realiza o humano. Para vocês, idiotas que já
produziram o inconsciente e o pré consciente mecânicos, que já sintetizaram a sensação, a
emoção, o sentimento e a percepção em laboratório, não será tão difícil assim fabricar a
idéia pessoal e, com ela o eu. Portanto, mãos à obra, cretinos.
A consciência coletiva
E se vocês acharam difícil produzir a sensação, a emoção, o sentimento, a
percepção, o significado, a idéia e o eu na maquina individualizada, pois agora é que vai
começar a dificuldade maior! Este movimento individual, que acontece na unidade homem
ou mulher (Zé ou Maria, ou no Zé Maria), só se realizará se for desencadeado e
impulsionado de fora do indivíduo. Sem indivíduo não há o humano mas não basta existir o
indivíduo para que o humano se faça. Vigostky, mais um humano interessante, explica que
este movimento de formação da consciência, da pessoa, do humano, não acontece por si só,
em si, biológico e geneticamente no interior do corpo individual, do organismo que
Para sobreviver na natureza cada ser vivo animal dispõe, inicialmente, apenas dos
seus dois instintos primários e fundamentais: de vida e de morte. Logo o indivíduo, a
unidade animal instintivamente cria a sensação de que a individualidade é muito pouco,
muito vulnerável e frágil, frente à totalidade natural. Os instintos semelhantes,
instintivamente, procuram se ajuntar para fortalecer as individualidades isoladas. A procura
dos instintos mais próximos, entre eles o principal é o da reprodução, possibilita que, em
primeiro lugar se unam em grupos os animais da mesma espécie. Formam, assim, a
manada: a combinação dos instintos dos seres da mesma espécie (entre eles o homem) para
a composição de agrupamentos que fortaleçam pela quantidade a fraqueza qualitativa de
cada individuo isolado. A manada é ainda um instinto, só que coletivo pois implica na
combinação dos instintos individuais, gerando a sensação coletiva. É, por isto, um instinto
superior, que possibilita à espécie ações mais complexas de defesa e de vida.
Na manada os instintos individuais vão sendo elaborados e combinados de modo
que as diferentes espécies e os diferentes agrupamentos nas espécies vão criando
combinações originais que se aprofundam desigualmente conforme a qualidade dos
problemas que a natureza apresenta especificamente e das soluções encontradas pelos
grupos. Entre elas a espécie humana se destacou criando variações cada vez mais originais
e em quantidades cada vez maiores. Num determinado momento a evolução da relação
individuo/manada entre os homens realiza um salto qualitativo gerando a comunidade.
A base sobre a qual se forma a manada é constituída pelos instintos semelhantes. E
o produto da manada é a sensação coletiva. A manada atua com os inconscientes pessoais e
gera o inconsciente coletivo. A comunidade se forma a partir da sensação coletiva da
manada. Ela elabora a combinação das sensações individuais com a sensação coletiva e,
neste processo, produz a percepção coletiva. E ao faze-lo gera dois processos desiguais e
combinados: os sujeitos pessoais e coletivo. Este duplo movimento combinado constitui a
pré-consciência coletiva. A comunidade se realiza no interior da manada assim como a pré-
consciência se sintetiza no interior da inconsciência. Assim como o surgimento da pré-
consciência não implica no fim da inconsciência, do surgimento da comunidade não
decorre o fim da manada. Ambas coexistem enquanto contrários de uma nova unidade,
onde no pólo da manada prevalece o instinto, e no pólo da comunidade prevalece o afeto.
Elaborando a percepção coletiva a comunidade gera a cultura, que é o plano de ação
coletivo que é a orientação resultante para a combinação dos sujeitos pessoais com o sujeito
Na comunidade os processos culturais se desenvolvem numa continuidade que
atravessa gerações resultando em diferentes culturas e etnias. Esta variação se aprofunda e
se diversifica até a produção de um novo salto qualitativo em que é gerada uma nova
combinação dos sujeitos pessoais com o sujeito coletivo: a coletividade. A coletividade é o
sujeito coletivo que se forma a partir de uma cultura determinada e a aprofunda até torna-la
produtora de conceitos, de processos lógicos e de pensamentos.
A coletividade se forma tendo como base a percepção coletiva da comunidade. Ela
elabora a combinação das percepções individuais que se expressam enquanto idéias
pessoais, com a percepção coletiva, na forma de idéia coletiva e, neste processo, produz o
pensamento, a idéia coletiva definida como referencia geral. Idéia e pensamento, neste
caso, são processos diferentes como nos explica Byon. Idéia é uma elaboração pessoal
enquanto pensamento é uma elaboração coletiva e histórica. Os processos culturais que
geram pensamentos chamamos de conceitos. Este movimento que combina história e
cultura, conceito e pensamento, lógica com criação, constitui a consciência coletiva. A
coletividade se realiza no interior da comunidade assim como a consciência se sintetiza no
interior da pré-consciência. Dois movimentos coletivos combinados e desiguais que se
desenvolvem em paralelo: num aspecto, constituindo a base da partida, a manada e no outro
aspecto., a inconsciência coletiva tecida a partir das inconsciências pessoais. Em seguida,
no inteior destes temos, respectivamente, a formação da comunidade num aspecto, e no
outro, a formação da pré-consciência coletiva, tecida a partir das pré-consciências pessoais.
E por fim, temos, no interior da comunidade a formação de coletividades, e, no interior da
pré-consciência coletiva a consciência também coletiva, costurada com as consciências
pessoais, e que constitui a racionalidade humana. Desta forma a manada coexiste com a
coletividade, a irracionalidade com a razão, o instinto com o conceito, numa totalidade
complexa e sutil que quero ver vocês, senhores idiotas, reproduzirem em laboratório.
É certo que vocês tem tentado materializar a cultura. Mas, sinto muito: os processos
culturais e conceituais jamais serão sintetizados em laboratório. Do movimento cultural o
que se pode materializar é o que Gordon Childe (olha aí, mais um humano interessante)
chamou de equipamento cultural. São os ritos, as celebrações, as proibições invisíveis (os
tabus), os rituais, as tradições que podem ser registradas em calendários, em leis, em
decretos oficiais, em cerimônias com pompa e circunstância, em feriados federais,
estaduais ou municipais, em monumentos (os totens) e outras formas concretas. Isto no lado
grandiloquente. Do lado cotidiano o máximo que vocês tem conseguido é fabricar lixo
cultural, restos de lixo humano, excrementos que sobram depois da digestão da cultura
criada pelos povos em sua luta vital pela sobrevivência.
Frank Júnior
Mas o mais chato de tudo isto, o mais desagradável desta questão da produção do
humano em laboratório é que, imaginando (porque imaginar é sempre possível) que vocês,
idiotas, consigam fazer cada uma das lições de casa que nós estabelecemos em cada passo,
com o mesmo zelo com que as equipes de FHC e de Lula fazem as lições determinadas
pelo Sistema financeiro mundial; que se vocês conseguirem produzir em laboratório a
sensação, emoção, sentimento, percepção, idéia e pensamento pessoais e coletivos, assim
mesmo, no final, vocês não terão conseguido produzir o humano do mesmo modo que
Palocci e Malan, Zé Dirceu e Serra não produziram desenvolvimento apesar de toda a
subserviência com que cumpriram os seus deveres. Simplesmente porque a receita que
passamos acima não consegue ultrapassar (e jamais uma receita ultrapassará) o limite de
um reles sistema. E um sistema só consegue parir outro sistema do mesmo modo que um
rinoceronte só pode gerar, se estiver saudável, outro rinoceronte. Paloccis geram
paloccinhos, Zes Dirceus, Zédirceuzinhos, tecnocratas, tecnocratinhos, idiotas, idiotinhas, e
máquinas, maquininhas. No final, o máximo que sairia da vossa linha de produção seria
uma espécie de Frank júnior, um Frankstein pós-moderno. E assim, usando o método
matemático conhecido como Reductio ad absurdium (redução ao absurdo, que consiste em
admitir o absurdo, no caso idiotas produzindo o humano, como verdadeiro), tereis
demonstrado para vocês mesmos, em seus próprios laboratórios e com os métodos e
técnicas que lhes são próprios, a nossa tese central: Só o humano pode gerar o humano.
E no final ainda resta uma esperança. A de vocês, nesta procura insana de produzir o
humano, se humanizarem. O que se leva desta vida é a vida que se leva. Tomara que o
resultado humanizante que vocês procuravam fora de vocês aconteça em vocês mesmos, na
vida que vocês levaram procurando levar algo desta vida. Vocês tem potencial para isto
afinal tiveram (e tomara que tenham ainda) mãe, pai, amigos, namoradas, amantes, medos,
prazeres, e tudo que cabem a todos os homens para se tornarem humanos. Prestem atenção
porque a tal verdade pode estar embaixo dos vossos narizes, onde geralmente está, e vocês
ainda não perceberam: se oriente, rapaz.
* Luciano Castro Lima é educador popular e professor.
BL21(DE3) F– ompT gal dcm lon hsdSB ( rB - mB -) λ(DE3) - an E. coli B strain with DE3, a λ prophage carrying the T7 RNA polymerase gene and lacIq - Transformed plasmids containing T7 promoter driven expression are repressed until IPTG induction of T7 RNA polymerase from a lac promoter. BL21 (DE3) pLysS F- ompT gal dcm lon hsdSB ( rB - mB -) λ(DE3) p
USING KERNEL DENSITY INTERPOLATION TO VISUALIZE THE EFFECTS OF MASS TREATMENT WITH IVERMECTIN ON HELMINTH PREVALENCE IN RURAL NORTHEAST BRAZIL Department of Geography and Anthropology University of Texas Health Science Center at San Antonio Department of Community Health - School of Medicine Federal University of Ceará – Fortaleza, Brazil Abstract Kernel density estimatio